quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

Romance? Reportagem? Cinema? Simplesmente: José Louzeiro

Naquela segunda metade da década de 50, o sol escaldante do Rio de Janeiro ardia inclemente no firmamento da então capital do Brasil, enquanto um nordestino franzino caminhava pelo centro da cidade a caminho do trabalho. Suava em bicas. Não era para menos. A despeito do verão tropical que elevava a temperatura para perto dos 40º C, ele vestia três camisas por baixo do paletó. No entanto não era por maluquice que o fazia. Era a única estratégia encontrada para não ser roubado novamente na pensão de Botafogo onde havia alugado uma vaga, pouco depois de chegar ao Rio vindo do seu Maranhão.
Esse jovem era José Louzeiro e ainda não se podia prever que ele se transformaria em um dos maiores escritores do Brasil, pioneiro nacional do gênero romance-reportagem, autor de mais de 50 livros, 10 roteiros para longas metragens e três telenovelas para a TV.
Mas sua vocação para o perigo, seu interesse pela crônica policial, seu empenho na defesa das liberdades democráticas e sua fascinação pelo personagem delinquente já estavam presentes em sua alma quando ele chegou ao Rio de Janeiro em 1954. Veio fugindo do Maranhão para não morrer assassinado após a publicação de uma matéria sua no jornal O Combate onde denunciava um influente político por prática de tortura.
Filho de um pedreiro, Louzeiro conseguiu estudar em um colégio particular através de uma permuta que seu pai fez com a escola. Em troca dos reparos feitos no prédio o pequeno José ganhou bolsa de estudos e não demorou muito até que suas redações se destacassem nas aulas de português, chamando a atenção do diretor do colégio que o encaminhou para o poeta e membro da Academia Maranhense de Letras Corrêa da Silva. Este o recomendou ao chefe da redação do jornal O Imparcial. Assim Louzeiro ganhou seu primeiro salário como aprendiz de revisor.
Seu trabalho consistia basicamente em ler e dessa forma mergulhou na obra de grandes autores maranhenses através do suplemento de literatura do jornal. Após 2 anos na função de aprendiz tornou-se repórter policial. Sobre o motivo que o levou para esse campo de trabalho, declara:
“Sempre achei o delinquente fascinante. Tudo explode nele com muita intensidade, exaltação. Ele é capaz de praticar o crime e chorar quando é condenado. Mata sem motivo... Investigar isso era o que me atraía e ainda me atrai.”
No Rio de Janeiro, inicialmente foi trabalhar como datilógrafo em uma empresa de máquinas gráficas de segunda mão, pois achava que ali teria contato com pessoas ligadas às redações de jornais e seu plano deu certo. Conseguiu uma vaga de boy na Revista da Semana passando em seguida para redator publicitário. Daí em diante sua carreira como jornalista deslanchou e em 56 ele foi para o Jornal Luta Democrática. Trabalharia também no Diário Carioca, Última Hora e O Correio da Manhã, onde permaneceu por oito anos.
Em 58 vendeu sua máquina de escrever para custear despesas com a publicação de seu primeiro livro, Depois da Luta, pela Editora Simões. Durante a ditadura foi censurado e preso junto de outros companheiros do Correio da Manhã como Carlos Heitor Cony e Álvaro Mendes, entre outros. Perseguido pelos militares decidiu se esconder em Brasília.
“Aprendi, com os anos de reportagem policial que o melhor lugar para se esconder é ao lado da polícia. Por isso fui morar em Brasília, em um prédio na Asa Norte, no qual o síndico era coronel do exército. Mas ele me adorava! Até descobrir quem eu era. Tive que fugir novamente.”
Mudou-se então para a capital paulista e conseguiu um emprego na Folha de São Paulo onde fez uma matéria sobre uma chacina promovida pela polícia que jogou vários meninos considerados infratores do alto de um precipício.  Alguns sobreviveram e Louzeiro os entrevistou. Dessa extensa matéria, a censura autorizou a publicação de apenas 30 linhas.
De volta ao Rio escreve o livro Infância dos Mortos que conta os detalhes de sua investigação sobre esse caso e que serviu de argumento para o filme “Pixote – A lei do Mais Fraco” de Hector Babenco. A partir daí o trabalho de Louzeiro não para mais de se embrenhar pelo cinema nacional e outro filme, também de Babenco, alcança grande sucesso baseado em um livro de Louzeiro: “Lúcio Flávio – O Passageiro da Agonia”. O livro conta a história do bandido Lúcio Flávio Vilar Lyrio que, perseguido pelo grupo de extermínio Esquadrão da Morte em plena ditadura militar, é preso e morto a facadas na cadeia.
José Louzeiro
Crítico contundente das arbitrariedades do poder, José Louzeiro escreveu duas novelas de grande sucesso para a extinta TV Manchete; Corpo Santo e Guerra Sem Fim, nas quais os bastidores do crime e da corrupção estavam presentes de maneira real e ousada. Sua terceira novela, O Marajá, era baseada no governo de Fernando Collor de Melo e foi proibida de ir ao ar, apesar de nessa época a censura não existir mais no país. Desde então não conseguiu mais trabalho na TV.
Entre seus livros mais famosos também está Aracelli, Meu Amor que conta o estupro e assassinato de uma menina de 9 anos e denuncia o envolvimento de duas famílias poderosas do Espírito Santo, o que lhe rendeu mais algumas ameaças de morte. Escreveu também inúmeras biografias como a da cantora Elza Soares, da enfermeira baiana Ana Nery e a de Gregório Fortunato, braço direito de Getúlio Vargas.
Prestes há completar 82 anos, Louzeiro está debruçado sobre seu novo projeto de uma autobiografia romanceada, enquanto luta bravamente há mais de 8 anos contra a diabetes que lhe ocasionou algumas amputações como a da perna direita, de parte do pé esquerdo e de alguns dedos da mão. A partir de sua batalha contra a doença, Louzeiro escreveu em 2007 Diabetes: Inimigo Oculto.
Cena do Filme "Pixote- A Lei do Mais Fraco"
Além de sua produtiva militância a frente do sindicato dos escritores, Louzeiro também é responsável pela iniciação e capacitação de diversos roteiristas que hoje estão atuando no mercado audiovisual brasileiro e que passaram pelos bancos de suas turmas da oficina de roteiro que ele ministrou por vários anos. Eu sou um deles e, ouvindo as histórias e causos desse maranhense, aprendi a admirá-lo. Foi baseado em uma história sua vivida na redação da Ultima Hora que escrevi o roteiro de meu primeiro curta metragem.
Agora, passados tantos outros, me preparo para meu próximo filme que será um documentário sobre esse bravo brasileiro que não temeu transitar pelo submundo da bandidagem para de lá extrair histórias reais com odores de romance, não aceitou as versões oficiais, não se curvou diante da ditadura e da censura e agora, não se intimida diante da diabetes. Uma História que precisa ser contada - para novas e antigas gerações - em romance, em reportagem, em cinema.·.





segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

Crack : Nada é tão ruim que não possa piorar.

Crack : Nada é tão ruim que não possa piorar.

Com o lançamento de meu livro “Sacudindo o Pó da Estrada” e de meu filme “O Brilho”, tenho participado de palestras, seminários e debates que abordam a questão das drogas, já que essas duas obras tratam através de linguagens distintas desse mesmo tema, tão presente na pauta de nossa sociedade. Passados quatro anos nos quais me dediquei a pesquisar esse assunto a partir da minha experiência pessoal no vício, o desafio de tentar entender o uso e o abuso de drogas ainda me fascina e me provoca diversas reflexões.
Desde os primórdios da civilização a humanidade se relaciona com algum tipo de droga ou alucinógeno, seja em suas atividades místicas ou religiosas, seja em rituais ou costumes tradicionais. A partir do movimento da contracultura dos anos 60, o consumo de drogas tomou ares revolucionários e de contestação, criando vínculo e afinidade com a juventude que possui em sua essência essas mesmas características.
No Brasil, nessa mesma época, imperava a ditadura militar que com seus aparelhos repressivos inibia qualquer tipo de rebeldia ou de transgressão. No entanto, a despeito das inúmeras políticas de prevenção e de combate às drogas, deflagradas no mundo inteiro, o consumo e a produção continuaram aumentando vertiginosamente dentro e fora de nosso país. No final dos anos 70, com a abertura política, a anistia, o movimento pelas diretas e os ares de liberdade que voltavam a soprar por nossas terras, cria-se um cenário propício para a ampliação da distribuição de entorpecentes e entra em cena de maneira mais abrangente uma droga que, até então, se mantinha elitizada nas classes mais altas e em alguns segmentos artísticos de vanguarda: a cocaína.
Insuflada no rastro da onda “disco” que varreu o mundo, a cocaína baixou de preço, aumentou sua oferta e ofereceu aos consumidores outro tipo de “viagem”. Uma droga urbana, “nervosa”, extremamente compulsiva e inquieta que, de modo devastador, alterou a rotina dos jovens consumidores e até mesmo a dos traficantes que a comercializavam, através de seus efeitos antissociais que inibem não só o sono ou a fome, mas também as relações de ternura e as conexões com a espiritualidade.
No início dos anos 80 os jovens entre 17 e 25 anos, entre eles eu, que tinham passado sua infância e adolescência, amordaçados pelo estado ditatorial, já podiam montar suas bandas de rock e seus grupos de teatro, externando suas opiniões e críticas a uma sociedade extremamente injusta e hierarquizada. Nesse cenário a cocaína conquista diversos adeptos com a falsa promessa de uma disposição inabalável e um vigor prazeroso e contínuo, que camuflam seu alto poder de criar dependência. Eu fui um dos cooptados.
No meio disso tudo, um enorme conflito se estabelece. Um conflito certamente inerente à natureza humana e travado desde os tempos mais remotos: o conflito do homem com ele mesmo. Potencializado no conflito do viciado, que vê rapidamente sua vontade própria se esvair e mergulha numa rotina de escravidão e degradação existencial. Como isso ocorre, como é feita essa escolha diariamente, como se comporta essa mente que percebe que está se prejudicando, mas ao mesmo tempo não consegue conceber sua vida sem a droga são perguntas que ainda hoje estimulam diversos estudos e pesquisas e que, muito recentemente, conseguiram inserir no debate da sociedade a ideia da “dependência química” como uma doença e não como uma deficiência de caráter. No entanto uma significativa parcela da população ainda encara o problema sobre a ótica tradicional que marginaliza e criminaliza o usuário.
Muitas outras questões ainda permanecem obscuras e suas complexidades se acentuaram com a chegada de novas drogas, as sintéticas e principalmente o crack, e com o amplo debate mundial em torno da descriminalização e da legalização das drogas hoje consideradas ilícitas. Debate esse movido pela constatação do total fracasso da chamada guerra contra as drogas, deflagrada no planeta sob o comando dos EUA.
No Brasil a partir dos anos 90, as crackolandias, inicialmente em São Paulo e depois no Rio de Janeiro, estampadas nos jornais e na TV revelam imagens fortes de grupos de viciados que se reúnem a luz do dia e a vista dos passantes para consumir essa droga derivada da cocaína. O crack oferece a mesmas sensações da cocaína através de sua combustão e da absorção através dos pulmões, potencializando sua ação e tornando o consumidor viciado em um curtíssimo espaço de tempo. Seu baixo preço também é fator primordial para a difusão da droga entre os pobres e o quadro de dependência dessa droga é de dificílima reversão. Para aqueles, como eu, que acreditavam ter conhecido na cocaína o estágio máximo da escravidão provocada pelas drogas, o crack chega para provar que nada é tão ruim que não possa piorar.
Atualmente o crack é considerado por muitos uma epidemia no Brasil e seus efeitos nefastos alcançam o interior dos estados, as pequenas cidades e as periferias com a mesma agilidade que vitimam também os condomínios de classe média alta das grandes capitais. A necessidade da droga que passa a pautar o comportamento do dependente leva-o a se desconectar de maneira radical de seus laços afetivos e psicossociais, infringindo perdas significativas. Rapidamente o usuário está incapacitado de cumprir seus papeis sociais e se sente impelido em frequentar esses grupos que se reúnem para o consumo diário e compulsivo da droga.
O crack expõe de maneira ostensiva aos olhos da sociedade contemporânea o antigo problema da dependência química e torna visíveis aqueles seres invisíveis aos olhos de uma população que ajuda a produzi-los.  Na lógica invertida dessa mesma sociedade é a droga e seus consumidores as causas dos problemas sociais. No entanto, percebemos ao nos aproximarmos dessa população de usuários, a repetição do padrão de histórias de ruptura de laços de solidariedade, de desintegração familiar, de segregação social e econômica, de incapacidade de inserção nos apelos consumistas e diversos outros fatos geradores que pré existem a droga e criam os espaços vazios propícios para a utilização da mesma como balsamo reparador de tantas amarguras. A partir da droga cria-se uma identidade e uma rede de vínculos recíprocos que parecem amenizar a vida desses cidadãos que foram barrados na festa do capital e do consumo e não foram tratados como cidadãos pelo estado e pela própria sociedade que os recrimina.
Os motivos que levam um indivíduo a se tornar dependente ou não de alguma substância ou comportamento são inúmeros e diversificados, variando em combinações de acordo com o sujeito, sua história de vida ou o ambiente que o cerca. Acredito que é hora de mergulharmos nesse desafio de entender e desvendar as causas e o mecanismo de construção de um dependente ao invés de simplesmente demonizarmos as drogas e colocarmos na conta dos dependentes os problemas sociais que nos afligem.
O patrocínio a pesquisas sérias no campo da neurociência que possam definitivamente esclarecer o impacto real de cada substancia no cérebro humano e suas consequências também são urgentes, para desconstruir mitos e tabus e pautar agendas qualificadas de discussão pública. Iniciativas humanizadoras como a implementada recentemente pelo programa “Operação de Braços Abertos” da prefeitura de São Paulo são louváveis, apesar da desastrosa e estranha ação do Denarc.
Como vemos, esse é um assunto que está longe de obter um consenso e os questionamentos e reflexões tanto na esfera pública como particular necessitam se despir de conceitos estabelecidos previamente para poder atacar o núcleo duro da questão.



sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

“A ONDA MALDITA” – Como Nasceu a Fluminense FM


“A ONDA MALDITA” – Como Nasceu a Fluminense FM

Éramos todos um pouco “estranhos”. Ou pelo menos era assim que nos viam nossos pais, nossos professores e aquele vizinho militar reacionário. Os cabelos compridos, a calça jeans surrada e a camisa Hang Ten, nem chamavam tanto a atenção como no passado, mas aqueles LPs sempre em baixo do braço espantavam muita gente. Principalmente quando nos trancávamos no quarto para tirar tudo o que as pequenas vitrolas podiam nos dar. Quando andávamos pelas ruas empunhando os clássicos de nossa coleção de vinis, fazíamos questão de colocar a capa do nosso favorito bem a vista, como um distintivo, um emblema que nos inseria na confraria fechada e incompreendida dos amantes do bom e velho rock’n roll. Era uma senha de identificação com nossos iguais que abria condições para novos relacionamentos que, invariavelmente, começavam com as impressões sobre a banda em destaque e se aprofundavam, chegando algumas até as discussões ferrenhas, porradarias, onde cada um defendia suas preferências e desdenhava as do outro. Religião não se discute. E o rock era nossa religião. Também olhávamos o mundo com estranheza e não compreendíamos a lógica selvagem da sociedade de consumo e as injustiças e incoerências do mundo a nossa volta. Só nos discos encontrávamos alento. Sentíamos uma saudade de um Woodstock onde nunca estivemos e uma grande melancolia com a perda prematura de nossos ídolos, ceifados pelo estilo rocker de vida e seus abusos. O rock era abusado. E enquanto o país caminhava para a tão sonhada democracia, nos orgulhávamos de nossos discos de um rock perseguido por tantas ditaduras e temido no seio das famílias mais conservadoras e caretas. Mas quando a agulha da vitrola cutucava insistentemente o selo central das bolachas, avisando que a audição havia chegado ao fim e saíamos de nossos quartos, nos sentíamos como viajantes perdidos em um deserto árido. Principalmente quando ligávamos o rádio e uma avalanche de mediocridade e repetições cansativas nos sufocava. Nessa hora, em que buscávamos nesse veículo tão poderoso e mágico algum som que saciasse nossa sede, também nos sentíamos “estranhos”. Ou estranho era o sistema que transforma tudo em produto, em dinheiro, e que havia nos expulsado das AMs e das FMs? Éramos órfãos da Federal e da Eldo Pop. Aguardávamos adoção. Um oásis onde pudéssemos ouvir nossa própria voz. Uma rádio estranha pelo amor de Deus!!!
Finalmente no início dos fantásticos anos 80, um boato varreu a cidade. Uma rádio rock existia. Em Niterói. 94,9 FM. Locutoras mulheres. Programação “estranha”. Como imaginar ouvir na rádio integralmente um pirata do Zeppelin gravado ao vivo? Ou um progressivo King Crimison com suas músicas de mais de 20 minutos, ou mesmo aquela faixa de nosso LP que achávamos que ninguém mais além de nós conhecia. Não estávamos mais sozinhos e não éramos tão estranhos assim.
É essa saga de resistência cultural no dial que nos conta Luiz Antonio Mello – criador da criatura junto de Samuel Wainer Filho – em seu delicioso e instigante livro “A Onda Maldita”, relançado agora pela Nitpress em comemoração pelos 30 anos da Fluminense FM. Com um texto descompromissado e irreverente como o rock deve ser e salpicado por revelações de bastidores, o livro oferece a nós, que vivemos a Fluminense, uma viagem de volta quase lisérgica aos porões do rock nacional que florescia pelas garagens do Brasil em 1982 e um reencontro emocionante com aquela rádio que marcou nossa juventude. Para os que não viveram a Fluminense, fica um testemunho de quem lutou contra a corrente para manter no ar uma rádio improvável que contrariou todos os prognósticos e escalou os primeiros lugares nas pesquisas de audiência da época. Um manifesto de que é possível sonhar, ousar e bagunçar o mercado com propostas de rádio sinceras e honestas.  
As limitações técnicas e financeiras não abateram aquela trupe da Maldita que com criatividade e com a sabedoria de alocar os diferentes talentos nos lugares certos, apostou na diversidade “pero no mucho” e na liberdade contida no lema que diz que todo tipo de música é valido desde que seja rock’n roll. Em tempos em que as rádios se orientavam para programações universais que, pela mediocridade, visavam atingir a todos nivelando o mercado por baixo em play listes de vinte títulos repetidos até a exaustão, a Fluminense – talvez sem saber – apostava na tal segmentação de mercado tão discutida hoje e apontada como a salvação das antigas e novas mídias.
Foi com certa emoção contida que voltei ano passado ao Circo Voador, para o lançamento do livro em noite festiva de tributo a Celso Blues Boy, figura recorrente da programação da Fluminense, tocado em fita K-7 quando o mago da guitarra ainda nem havia gravado seu primeiro LP. Bom rever Luiz Antonio Mello do alto de seus quase 1,90m, com os cabelos grisalhos como os meus e longe da magreza quase cadavérica que o acompanhou nos tempos de luta insana da Maldita. Melhor ainda passear por seu texto competente de jornalista experiente.
Luiz Antonio Mello
Fui ao Circo acompanhado de um velho amigo das históricas edições do Rock Voador, projeto produzido pelo furacão Maria Juçá. Ele me lembrou de que havia levado formigas em um vidro para serem trocadas no Arpoador por camisetas da banda Adan And The Ants em uma das folclóricas promoções da rádio que, inevitavelmente, acabavam em tumulto e polícia. Demonstração cabal do poder da rádio e de seu alcance junto à rapaziada do rock. Essa e muitas outras bagunças estão no livro. E ao lê-lo me senti outra vez incrivelmente “estranho” e feliz. Feliz em ter vivido um pouco dessa história e em poder agora tê-la perpetuada nessa obra obrigatória para quem quer entender uma pouco mais de rock, de sonho, de rádio e de luta. Com vocês, em 94,9 MHZ, FM Fluminense, a para sempre Maldita. E “estranha” como nós.



quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

SÓ FALTOU O TARKUS


SÓ FALTOU O TARKUS
No sábado passado (18/01) a Carl Palmer Band aterrissou na tenda montada ao lado do CCBB do Rio de Janeiro para um show dentro da programação da Mostra Internacional de Rock Progressivo. Oportunidade única para os aficionados desse estilo que, depois do auge nos anos 70, caiu no descrédito em tempos de música previsível, preguiçosa e de fácil digestão, com pouca – ou nenhuma - elaboração rítmica e conceitual.
Já nos arredores do evento era possível identificar os cabelos longos – dos que conseguiram consevá-los - e grisalhos que se esparramavam timidamente sobre as indefectíveis t shirts com estampas de grupos como Yes, Pink Floyd, Gentle Giant, Jethro Tull e outros jurássicos dando um clima de deja vu que só era contestado pela presença também significativa de jovens e até crianças que, provavelmente, acompanhavam seus pais, tios e avôs.  
Lotação esgotada, casa cheia e muita expectativa até que Carl Palmer subiu ao palco acompanhado dos jovens músicos Paul Bielatowicz (guitarra) e Simon Fitzpatrick (baixo). Em uma forma física invejável para um senhor prestes a completar 64 anos, Palmer desceu o braço e as diferenças etárias no palco e na plateia desapareceram como em passe de mágica.
O entrosamento da banda e o virtuosismo dos músicos que acompanhavam Palmer já puderam ser constatados nos primeiros acordes, mas não diminuíram a expectativa dos fãs do Emerson, Lake & Palmer que esperavam ver um revival do repertório da banda, um dos mais vitoriosos e marcantes grupos de rock progressivo de todos os tempos. Mas o Power trio montado por Palmer foi além.
Números como Knife Edge (ELP-1970) e Hoedown (Trilogy-1972) mostraram o franzino Paul Bielatowicz se agigantando em novos arranjos sem a pretensão de ocupar espaços deixados pela ausência do órgão Hammond e do sintetizador Moog de Keith Emerson que foram a marca registrada do som do ELP. E a opção de partir para um som mais pesado e original, embora ainda marcado pelas tradicionais convenções extraídas da música clássica, parece que foi a escolha certa. Foi possível confirmar isso a partir da execução primorosa do movimento O Fortuna da ópera Carmina Burana, que levantou os primeiros aplausos realmente enlouquecidos da plateia.
E as gratas surpresas continuaram com o solo do excepcional baixista Simon Fitzpatrick que contemplou o público com uma versão emocionante de Stairway to Heaven do Led. Falar sobre a bateria de Palmer é um desafio, pois nela a levada e o solo se confundem e nunca conseguimos adivinhar para onde o músico vai antes que ele chegue lá. E é exatamente isso que fez com que o show na tenda do CCBB se transformasse em um dos shows que vou guardar na prateleira dos melhores que já assisti. O show foi mais curto do que todos esperavam, mas o bis com Fanfare for the Common Man, com direito a solo apoteótico e irreverente de Mr. Palmer compensou. Nota 10 também para o som extremamente bem equalizado.
Para os que acreditam que o rock progressivo é um estilo superado e chato, com suas suítes lisérgicas intermináveis e estéreis, a Carl Palmer Band mostrou aos cariocas que diante de tanta mediocridade que reina na música mundial, uma progressive band pode fazer algo muito importante e necessário: surpreender-nos positivamente, com um virtuosismo que não é uma simples masturbação musical, mas que se comunica com o público e nos tira do conforto e do lugar comum. Showzaço onde Carl Palmer exibiu talento e simpatia, autografando pôsteres e CDs após a apresentação. Única resalva foi a ausência, apesar de inúmeros pedidos urrados pela plateia e por mim, de pelo menos um trecho do álbum Tarkus (1971), em minha opinião, o melhor do ELP.

terça-feira, 21 de janeiro de 2014

A MULATA DO CINE VITÓRIA

A MULATA DO CINE VITÓRIA
Um conto de Antonio Ernesto

Sempre que ia para a casa de sua Tia Alice, pegava o ônibus da linha 184, Central-Laranjeiras, e ao passar pela Cinelândia, percebia as meninas de vida fácil flanando sem vergonhas da vida. Sabia que ofereciam seus corpos a quem tivesse dinheiro para pagar. Várias vezes pegou o ônibus decidido a descer no primeiro ponto após a Rua Evaristo da Veiga e contratar os serviços de uma daquelas profissionais. Uma vez chegou até a desembarcar, encorajado por sua libido que chacoalhava irrequieta no liquidificador dos hormônios púberes. Mas a timidez virgem, mal disfarçada por detrás de seu rosto castigado pela acne, o colocou de volta ao outro coletivo que vinha logo atrás, sem que conseguisse qualquer contato com aquelas prostitutas.
Uma em especial lhe chamava a atenção. Ficava sempre em frente ao extinto Cine Vitória, número 45 da Rua Senador Dantas, ao lado de uma floricultura. Era uma mulata de quadris descomunais e se destacava das outras meretrizes do lugar por estar em uma faixa etária um pouco mais próxima a dele. Devia contar uns 30 anos, enquanto as outras pareciam bem mais velhas e gastas. Afinal, 30 anos eram apenas um pouco mais do que o dobro da idade dele. Depois de várias tentativas e outras tantas desistências, em uma tarde morna de verão, encheu-se novamente de coragem, desceu do ônibus e foi em direção àquela mulata que bem poderia ser uma personagem do cartunista Lan.
Quando chegou perto da mulher, ela lhe atravessou a alma com um olhar tão assustador, que petrificou seu maxilar e todo o resto do seu corpo. Só conseguiu grunhir entre os dentes um cumprimento que na verdade já queria ser uma despedida. A mulata retribuiu.
- Oi bebê. E aí? Vamos?
Ele não sabia o que tinha sido pior: ser chamado de “bebê” ou a falta de rodeios com que aquela mulher havia entrado no assunto. Automaticamente fez com a cabeça que sim. Assim, mais de perto, pode ver que a mulata era realmente uma mulher bonita. Devia ter uma grande clientela, pensou. Ela convidou-o a segui-la e saiu andando na direção do Passeio Público, onde ficava a loja de departamentos Mesbla. No caminho informou o preço dos seus serviços. Após um cálculo rápido do que tinha nos bolsos ele concordou mecanicamente. Tentou travar algum diálogo durante a caminhada, que começava a durar uma eternidade, mas seus assuntos haviam desaparecido em um passe de mágica deixando em seu lugar apenas uma dose cavalar de ansiedade e um pavor de ser visto por alguém conhecido.
Um pouco antes do Teatro Serrador, ao lado de uma sapataria, aquela bunda imensa entrou em um corredor estreito que levava os sorrateiros para um prédio com várias salas comerciais. Na entrada a mulata foi cumprimentada pelo porteiro com um sorriso maroto que por pouco não fez o cliente estreante disparar uma correria envergonhada que só pararia na Praça Tiradentes, onde poderia pegar a condução para casa. Pensou consigo mesmo: “É agora ou nunca. Agora não tem mais volta.”
Chegou a se ofender mentalmente: “Deixa de ser covarde seu mariquinha, filhinho de mamãe.” Subiram dois lances de escada. Tentava acalmar a respiração. A mulher parou em frente a uma das várias portas do extenso corredor e tocou a campanhia.
Pensou: “É melhor voltar outro dia.” Mas antes que pudesse externar suas hesitações e inventar alguma desculpa para descer aqueles degraus por onde subira, a porta se abriu e revelou um velho de cabelos grisalhos, barba por fazer e com os dentes amarelados de nicotina. Sem disfarçar seu mau humor que parecia saltar de seu semblante, o velho afastou-se para que o casal entrasse e fechou a porta nas suas costas.
“Agora já era.”, pensou, enquanto vasculhava o lugar com seu olhar tímido procurando uma outra alternativa de fuga que não fosse a porta fechada pelo homem de aparência suja. A mulata o pegou pela mão e o levou a um corredor iluminado por uma luz fraca e vermelha onde haviam vários biombos separados por folhas finas de compensado, que escondiam suas intimidades através de cortinas também finas de um estampado de gosto duvidoso. De um desses biombos vinham gemidos de alguma trabalhadora daquela empresa. Ela parecia estar se esforçando em cumprir bem o seu dever, aumentar a produtividade, atingir as metas.
Achou que seu coração havia parado. Ou batia tão forte que não dava pra sentir o seu bater. Sua acompanhante afastou com a mão uma das cortinas revelando um pequeno quadrilátero com uma maca de hospital, forrada com um lençol puído que um dia devia ter sido branco. Não havia janela. Nem pular por uma era possível.
- Vai tirando a roupa, bebê, que eu já venho.
A mulher saiu e o frio que estava na sua barriga fugiu para sua espinha dorsal, voltou para a barriga e se alojou nos seus pés quando ele tirou os sapatos. Só de cuecas sentou-se na maca que era alta e que deixou suas pernas suspensas no ar. Lembrou-se das vezes em que tinha estado em um hospital e do pavor que tinha de injeção.
“Não”. Não podia pensar nisso agora. Tentou mentalizar os “catecismos” em quadrinhos eróticos de Carlos Zéfiro, que algumas vezes haviam caído em uma de suas mãos enquanto a outra ficava ocupada. Nada dava certo. Não conseguia se acalmar. Pensou em pedir ajuda a Deus. Mas lembrou de que aquilo não era assunto para ser levado às esferas divinas. Com certeza o Criador iria se aborrecer e aí é que nada daria certo mesmo. É bom lembrar que eram tempos em que não havia AIDS. Já ouvira falar em Camisa de Venus, sabia como era usada e que servia para evitar a gonorreia e a gravidez. Mas nunca tinha visto uma de perto.  “Palavra feia essa tal de gonorreia.”, pensou. “Talvez devesse ter trazido uma camisinha.” É isso. “Essa é uma boa desculpa: falo pra ela que vou comprar uma camisinha e não volto mais.” Ainda nem tinha arquitetado totalmente o seu plano de fuga, quando a mulata entrou no cubículo. Ela não estava sem roupas. Trazia apenas uma toalha, uma pequena bacia e uma garrafa de álcool nas mãos.
- Pode deitar bebê.
Se esticou na maca como se fosse um defunto no necrotério.
- Você tá nervoso?
A mulata fez essa pergunta de resposta óbvia enquanto levava as cuecas do garoto até os joelhos, revelando suas partes intimas e todo o seu desconforto com aquele momento.
- Vamos dar uma limpezinha nele?
Não dava pra responder nada. “Ele” a essa altura do campeonato já havia sumido em meio à vegetação do seu púbis imaculado. Havia abandonado o campo de batalha como um desertor covarde deixando-o desarmado diante da fera sanguinária. Foi quando as primeiras gotas do álcool banharam “ele”, gelando tudo o que, por milagre, pudesse ainda não estar gelado. Deu um pulo da maca como um moribundo reanimado por um desfibrilador. Enquanto se recompunha e vestia suas calças recorreu ao seu dom de bom contador de histórias. Disse que uma antiga namorada havia feito macumba para ele.  A mulata se mostrou compreensiva e até recomendou um pai de santo, seu conhecido, que poderia desfazer o trabalho. Mas a compreensão não foi suficiente para não cobrar o cachê acertado previamente.
Entregou as cédulas e desceu aquelas escadas arrasado e aliviado ao mesmo tempo. Encontrou novamente o sorriso malicioso do porteiro na saída, mas dessa vez retribuiu na mesma moeda como quem, triunfante, havia desfrutado plenamente de tudo que aquele corpo de aluguel podia oferecer. Aquela satisfação mentirosa, jogada na cara do porteiro sugeria refestelo. Foi um gol de honra marcado aos 45 do segundo tempo. Mas não evitou a sua derrota por goleada.
Alguns meses depois a mulata desapareceu para sempre do seu tradicional ponto. Nunca mais a viu por lá. Sempre a procurava através do vidro da janela do 184, Central-Laranjeiras. Mas ela sumiu sem chance de revanche. Talvez tivesse mudado de empresa ou se casado com um cliente rico e apaixonado.


Caminhando para a casa de sua Tia Alice deixou escapar pelo canto de seus lábios um pedaço daquele mesmo sorriso que trocara com o porteiro. Imaginou sua vergonha se essa história vazasse para alguns de seus amigos. Finalmente, depois de muito sofrimento, conseguiu fazer aquele fiasco parecer engraçado, amenizado pela ação do tempo e protegido no segredo da sua memória. 

“HOJE JOGUEI TRÊS HORAS DE MINHA VIDA NO LIXO” OU “RÉQUIEM DE UMA CIDADE SEM SENTIDO”



“HOJE JOGUEI TRÊS HORAS DE MINHA VIDA NO LIXO” OU “RÉQUIEM DE UMA CIDADE SEM SENTIDO”

No rádio do carro mais uma propaganda. De carro. Além do freio ABS, do limpador inteligente, teto solar automático, GPS, computador de bordo e o raio que o parta, o que chamava a atenção eram as trocentas prestações que facilitavam a compra daquele fetiche capitalista, bastião da promissora política econômica do governo. Política econômica alicerçada no consumo da classe média emergente e do acesso dos sempre mais pobres a essa classe enigmática até para Marx.

Sexta feira no Rio de Janeiro e eu já previa o que me esperava. Ou achava que previa. Minhas táticas e planejamentos para evitar me deslocar pela minha cidade em horários de rush e em sextas feiras haviam sido derrotadas pela necessidade inadiável de cumprir compromissos profissionais em Ipanema, uns 40 km distante do subúrbio carioca onde moro. Onde milhões moram. Às 16h45min entrei em meu carro estacionado no entorno da Lagoa Rodrigo de Freitas. Tive que estacionar ali e andar três quilômetros para ir e mais três para vir dando graças a Deus por conseguir uma vaga, tão “pertinho”. E às 17h45min ainda não havia conseguido chegar ao Túnel Rebolsas. Em um hora havia me deslocado, ou melhor, me arrastado uns sete quilômetros. Eu e meu carro. Meu eletrodoméstico ultrapassado e inútil. Troquei de estação e depois de flashs alarmantes sobre a situação caótica do transito em toda a cidade, mandadas por um repórter aéreo em seu helicóptero, novamente o mesmo comercial de carro. Os mesmos avanços tecnológicos daquela ilusão de metal e as mesmas trocentas prestações. E sem entrada. Do meu lado um carro com as mesmas modernidades e... parado, igualzinho ao meu popular com motor humilde e sem vidro elétrico. Nós dois pasteurizados naquela massa barulhenta de aço e borracha. Lentos, agonizantes, agoniados.

Dentro do túnel a tortura é mais nazista. Lembra o que ouvimos falar da câmara de gás de Sobidor. Somos prisioneiros engavetados em nossos casulos automotores rodando lentamente para tentar chegar. Simplesmente chegar é o que queremos. Mais meia hora para sair daquele buraco a ver a luz do sol que a essa altura já desistia dessa loucura e fugia por de trás do Corcovado ou sei lá por onde. Rio cidade de gente feliz. Diz a campanha da prefeitura de braços dados com o governo do estado e o federal, dançando juntos a sinfonia da nova ordem mundial e suas economias promissoras, livres das crises do velho mundo.
O Rio tem urgência. Urgência de construir estádios. Urgência de atender aos prazos dos grandes eventos. Urgência em aprovar projetos e orçamentos que farão os cariocas mais felizes e as empreiteiras e campanhas eleitorais mais opulentas. Mas o transito em volta de mim não tem a mínima urgência. Escorre pegajoso pelo asfalto escuro como um catarro grosso e decadente. Está retido na falta de transporte público decente, na ausência de investimentos na malha ferroviária e no projeto esdrúxulo de um metrô que se expande esticando as mesmas linhas com a principal finalidade de evitar uma nova licitação e uma possível troca da atual concessionária. Interesses pragmáticos da nossa democracia de coalizão. A educação e a saúde também não tem urgência. Esperam nas filas dos hospitais e nas salas de aula sem professores. Enquanto isso o sujeito ao meu lado, eu seu carro muderno, parece à beira de um ataque de nervos. Todos estão prontos para matar ou morrer ao mínimo roçar de para choques. 

Eu tento me controlar, mas a musculatura de minha perna dá sinais de falência múltipla esgotada pelo eterno acelera, freia, engrena. Uma hora e meia depois já estou na Linha Vermelha, aquela via expressa (expressa? piada de mal gosto!) criada para desafogar a Avenida Brasil.  E aquela procissão neurótica não dá sinais de terminar, aumentando desleixadamente o consumo de combustível e agredindo covardemente a natureza que, embora não saiba se defender, já prepara sua vingança.

Nada faz sentido. A metrópole não faz sentido em sua desumana imobilidade urbana. Assim como a sociedade industrial não fazia sentido para os flaneurs do século XVIII tentando entender tanta desigualdade e miséria. Queria ver eles flanarem na Linha Vermelha. E o filho da puta do comercial de carro outra vez. Temos que vender carros. Os carros dão status e fazem os eleitores felizes. Seus votos farão seus representantes andarem de helicópteros e jatinhos sem engarrafamentos.
Três horas depois, ás 19h45min estou chegando em casa. Três horas de minha vida jogadas no lixo. Seis de ida e volta por dia útil. (útil? outra piada infame!) 30 por semana. 120 por mês. 1440 horas por ano. Em cinquenta anos 72.000 horas. 3.000 dias de vida jogados no lixo de uma cidade sem sentido.


Paro de fazer contas e, esgotado, rezo agradecendo a São Home Oficce que tem me abençoado nos últimos anos e mando meus melhores pensamentos para minha editora Noga que abandonou o cárcere privado coletivo em que vivemos pra morar no seu Vale do Sossego. Longe dessa cidade que conseguiu embaralhar palavras de significado tão antagônicos como “privado” e “coletivo” nessa lógica da tal urgência.