“A ONDA MALDITA” – Como
Nasceu a Fluminense FM

Finalmente no início dos
fantásticos anos 80, um boato varreu a cidade. Uma rádio rock existia. Em
Niterói. 94,9 FM. Locutoras mulheres. Programação “estranha”. Como imaginar
ouvir na rádio integralmente um pirata do Zeppelin gravado ao vivo? Ou um
progressivo King Crimison com suas músicas de mais de 20 minutos, ou mesmo
aquela faixa de nosso LP que achávamos que ninguém mais além de nós conhecia.
Não estávamos mais sozinhos e não éramos tão estranhos assim.
É essa saga de resistência
cultural no dial que nos conta Luiz
Antonio Mello – criador da criatura junto de Samuel Wainer Filho – em seu
delicioso e instigante livro “A Onda
Maldita”, relançado agora pela Nitpress em comemoração pelos 30 anos da
Fluminense FM. Com um texto descompromissado e irreverente como o rock deve ser
e salpicado por revelações de bastidores, o livro oferece a nós, que vivemos a
Fluminense, uma viagem de volta quase lisérgica aos porões do rock nacional que
florescia pelas garagens do Brasil em 1982 e um reencontro emocionante com
aquela rádio que marcou nossa juventude. Para os que não viveram a Fluminense,
fica um testemunho de quem lutou contra a corrente para manter no ar uma rádio
improvável que contrariou todos os prognósticos e escalou os primeiros lugares
nas pesquisas de audiência da época. Um manifesto de que é possível sonhar,
ousar e bagunçar o mercado com propostas de rádio sinceras e honestas.
As limitações técnicas e
financeiras não abateram aquela trupe da Maldita que com criatividade e com a
sabedoria de alocar os diferentes talentos nos lugares certos, apostou na
diversidade “pero no mucho” e na
liberdade contida no lema que diz que todo tipo de música é valido desde que
seja rock’n roll. Em tempos em que as
rádios se orientavam para programações universais que, pela mediocridade,
visavam atingir a todos nivelando o mercado por baixo em play listes de vinte títulos repetidos até a exaustão, a Fluminense
– talvez sem saber – apostava na tal segmentação de mercado tão discutida hoje
e apontada como a salvação das antigas e novas mídias.
Foi com certa emoção contida
que voltei ano passado ao Circo Voador, para o lançamento do livro em noite
festiva de tributo a Celso Blues Boy, figura recorrente da programação da
Fluminense, tocado em fita K-7 quando o mago da guitarra ainda nem havia
gravado seu primeiro LP. Bom rever Luiz Antonio Mello do alto de seus quase
1,90m, com os cabelos grisalhos como os meus e longe da magreza quase
cadavérica que o acompanhou nos tempos de luta insana da Maldita. Melhor ainda
passear por seu texto competente de jornalista experiente.
![]() |
Luiz Antonio Mello |
Fui ao Circo acompanhado de
um velho amigo das históricas edições do Rock Voador, projeto produzido pelo
furacão Maria Juçá. Ele me lembrou de que havia levado formigas em um vidro
para serem trocadas no Arpoador por camisetas da banda Adan And The Ants em uma das folclóricas promoções da rádio que,
inevitavelmente, acabavam em tumulto e polícia. Demonstração cabal do poder da
rádio e de seu alcance junto à rapaziada do rock. Essa e muitas outras bagunças
estão no livro. E ao lê-lo me senti outra vez incrivelmente “estranho” e feliz.
Feliz em ter vivido um pouco dessa história e em poder agora tê-la perpetuada
nessa obra obrigatória para quem quer entender uma pouco mais de rock, de
sonho, de rádio e de luta. Com vocês, em 94,9 MHZ, FM Fluminense, a para sempre
Maldita. E “estranha” como nós.
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